domingo, 6 de abril de 2014

“Quem quiser passar além do Bojador, tem que passar além da dor”….

 … que é como quem diz: “quem quiser sair da Europa civilizada, tem que ir à Loja do Cidadão, gramar a bucha, e tirar o passaporte”.


Pois é, meus 5.75 leitores. Após horas de reflexão, o Lobo concluiu que o nosso grande poeta, Fernando Pessoa, nunca teria dedicado a sua épica obra: "Mensagem" à saga dos descobrimentos, se, no tempo dele, tivesse existido uma epopeia ainda maior, de seu nome “Loja do Cidadão”. 

Após ter andado, durante alguns dias [se calhar semanas], a empurrar o fantástico e espetacular momento da renovação do passaporte, o Lobo aborrecido lá se dirigiu a esse mítico estabelecimento. Em boa verdade, ao início, a coisa até nem começou mal. O sistema de senhas é porreiro e bastante user friendly. O funcionário que dava apoio era simpático e prestável, e até havia uma lugarinho muito jeitoso em frente ao guichet [o termo não está bem aplicado, mas ADORO esta palavra]. 

Até aqui, tudo muito certo. Mas, quando, passada uma hora, a bateria do telemóvel faleceu e levou embora o facebook, é que me comecei a aperceber da gravidade do problema. Desde que me havia sentado, a fila dos pedidos de passaporte NÃO tinha andado UM ÚNICO número. Anúncios como: “Excelentíssimos utentes, pedimos muita desculpa, mas as senhas A para o serviço X estão suspensas devido a uma falha informática” [e os gajos dos computadores vão demorar 5680958956 triliões de anos a detetar o problema, por isso, chapéu. Acrescentei mentalmente], ou: “Caríssimos fregueses, lamentamos muito pelo incómodo, mas o sistema informático da repartição B seguiu o exemplo da A e entregou a Alma ao Criador. Assim sendo, têm duas opções: ou montam uma tenda de campanha aqui à porta, para não perder a senha, ou vão morrer longe, e voltem cá para o mês que vem, quando tudo estiver reposto. ” [pronto, se calhar este último foi ouvido, apenas, dentro da minha cabeça. Mas juro que pareceu tudo muito real].

Anyway, esta questãozinha com o telemóvel, permitiu-me ir ouvindo os atendimentos à minha volta, e aprender coisas espetaculares:

[Menina do Guichet] - “O fornecedor é que passa a fatura com o IVA. Ou seja, põe o seu número de contribuinte, manda para Eles, e o senhor fica automaticamente inscrito no sorteio”. (Esclarecimento ao Senhor António, que estava muito aflito porque não sabia como é que se podia habilitar a um Audi);
[A mesma menina do mesmo Guichet] - “E o sistema é igual ao da lotaria. Há um sorteio, e, se ganhar, Eles ligam-lhe” [Eles?? Eles outra vez?? Mas quem raio é que são E-L-E-S? WTF? Deu-me vontade de perguntar, mas contive-me. Ahh, estão a ver. Lobo Bonito]
[Senhor António, se me estiver a ler, tenha isto em atenção. Pelo que eu percebi, o senhor já não tem “Patroa”. Ponha-se à viva, porque a menina do Guichet estava a dar a mesma conversa a todos os viúvos que lhe apareciam à frente. Eu estava lá e ouvi tudo. Com aquele ar profissional, ela quer é dar uma volta de topo de gama, e, a seguir, chumba-lha a reforma.]

Estava eu entretida a ouvir as explicações da Menina do Guichet a outro viúvo, que estava com um problema gravíssimo com os rendimentos e os IMIS, [tenho a certeza que, a seguir, ia esclarecer o senhor sobre a história do sorteio do Audi, mas já não apanhei essa parte.], e eis que chega o momento mais esperado do dia: A vez do Lobo:

[Doutora X] – “Muito bom dia, é para pedir a renovação de passaporte?
[Lobo] – “É sim, por favor.”
[Doutora X] – “Preciso do seu cartão de cidadão e do passaporte antigo”
[Lobo] –“Ups. Peço imensa desculpa, mas não o tenho comigo”.
[Doutora X] – “Foi roubado?”
[Lobo] –“Não”.
[Doutora X] – “Extraviou-se?”
[Lobo] –“Não”.
[Doutora X] – “Então, o que lhe aconteceu?”
[Lobo] –“Bom, fiz a mudança de casa há pouquíssimo tempo, tenho as coisas em caixas, e não o consigo encontrar.”
[Doutora X] – “E apresentou queixa na polícia?”
[Lobo] –“[Só se fosse para me prender, por ser uma pessoa pouco organizada] “Também não porque eu sei mais ou menos onde está, só não o encontrei.”
[Doutora X] – “Então vai ter que escrever uma declaração a justificar o sucedido”.
[Lobo] –“Ok, vamos lá despachar isto. [Doutora X, não me interprete mal. Eu até gostava de ficar aqui mais umas 5 horas a ouvir os atendimentos para ficar ultra expert em IMIS, Cabeças de Casal, e IRS encalacrados. Também adorava ganhar um AUDI. Aliás, com esta crise, dava-me um jeitaço. Ia ser o júbilo da massa associativa. Tenho a certeza que a menina do Guichet seria uma ajuda preciosa neste meu projeto. Apesar de ter a consciência que, se eu fosse um viúvo, ela seria ainda mais prestável. Lamentavelmente tenho mais que fazer, nomeadamente ir à minha vida, por isso, sim. Vamos despachar isto].


PS- Fiquei mesmo feliz por ELES não me terem ficado com o passaporte antigo. Apesar de já ter expirado, tem carimbos que quase me custaram a vida. India, Indonésia, China, Singapura, Maldivas, Hong Kong, Macau. Apesar de alguns de vocês quase me terem morto, como é que vos podia deixar ir, assim, embora da minha vida?

1 comentário :

  1. Minha querida Akra, eu tenho passado por isso de tantos em tantos anos e perdi passaportes (tipo colecção completa) o meu agora tem apenas uma pagina livre...sim UMINHA !!! =P Tenho de o ir renovar MESMO, mas senão o entregar, vou pagar carissimo!!..sabes que agora entras numa lista de nomes que têm um passaporte em parte incerta..vais começar a pagar isso carissimo em MUITOS locais do mundo..prepara-te !!! Ass. O Boi Cavalo.

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