terça-feira, 2 de setembro de 2014

Sobre o Amor

Dizem que, para existir, o amor tem que ser físico. Dizem que: “O amor à distância perdeu-se pelo caminho”. Nunca concordei com esta frase. Comecei por desconfiar em criança, sempre que o meu pai se ausentava, em trabalho, por longas temporadas. A minha certeza ficou mais sólida no momento em que o meu irmão saiu do país, primeiro para estudar, depois para trabalhar. E não voltou. A distância de uma, duas, três escalas de avião, nunca foi um impedimento para nós. Mas só a confirmei no dia em que a minha avó morreu. Foi há dois anos que recebi um telefonema. Podia ter sido há cinco minutos, a dor que sinto é a mesma. Aquele telefonema: “Vem já para aqui porque a avó sentiu-se mal e acho que morreu”. “Morreu? Como morreu? Os imortais não morrem”. O INEM tentou mas não conseguiu fazer nada. O coração tinha parado. Corri e ainda a vi sair de casa na maca, já sem vida. Não tinha o ar tranquilo dos filmes. No rosto ficou a expressão angustiada de quem foi levado à força. Foi o pior dia da minha vida. Eramos almas gémeas. O nosso amor sempre foi sincero e profundo. Apesar dos avisos médicos, sempre me recusei acreditar que a iria perder. Coube-me a mim a tarefa de ligar ao meu irmão, que estava na Holanda, e dizer: “A avó morreu. E eu deixei”. Ontem dei por mim, a falar desse episódio, pela primeira vez, sem chorar. E questionei-me se já o tinha aceitado. Mas não. Concluí que, à medida que o tempo passa, a dor é maior. E o amor também. Não me conformo. Não aceito, e não tenho outro remédio. Ainda hoje passo lá em casa com a esperança de a ver. Ainda hoje pego no telefone para lhe ligar. Mas já não há ninguém para atender. Como é que é possível? Acredito que, daqui a dez anos, vou continuar a ter a mesma reação. Concluí que, quando o amor é verdadeiro, a distância e a ausência física não o diminuem. Antes pelo contrário. Só o fazem crescer, bem como a dor da perda. Cobardemente, não consigo ir ao cemitério. Tenho que ser arrastada. Doí-me porque não aceito. E nunca vou aceitar. É como deixar de ser adepta do Porto e passar-me para o “Recreativo da Luz”. Jamais.  Não preciso de a ver para a amar. Um dia a gente encontra-se. Até lá, o meu sentimento vai permanecer inabalável. 

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