segunda-feira, 14 de julho de 2014

Crónicas de um Fumador [In]veterado

Fumo desde os dezoito anos. Tudo aconteceu numa viagem de finalistas a Palma de Maiorca com o clássico: “Deixa lá experimentar”. E experimentei. Até hoje. Com o tempo, a minha relação com o cigarro passou a ser pautada por um amor/ódio crescente. Se, por um lado, me sabia bem depois do café, numa noite de copos, e após uma refeição gratificante, por outro, acabou por se tornar numa muleta sem razão de existir. Cada espera, cada momento de solidão, cada situação de stress e ansiedade, eram preenchidos com um cigarro. Mesmo que o corpo não pedisse, a mente, mal-intencionada e manipuladora, a isso obrigava.

Comprar um maço de tabaco passou a fazer parte dos meus hábitos diários. E o hábito, já dizia o outro, é uma segunda natureza. Muitas vezes, na faculdade, passava o lanche ou outra refeição importante para poder comprar cigarros. Coisa assustadora, eu sei, mas o orçamento era curto. Nos últimos anos, a pausa para o cigarrinho fazia parte da rotina do Lobo. Sem perguntas nem questões. Era tão normal como comer ou dormir. Contudo, esta relação, aparentemente feliz, na verdade estava podre por dentro. O primeiro cigarro do dia deixava-me tonta, e irritava-me solenemente a obrigação de ter que comprar, como um alcoólico que não passa sem vinho, ou um drogado que precisa de cavalo para se levantar da cama.

Na verdade, nunca lidei bem com o facto de depender de um veneno assumido, que me iria provocar uma morte lenta sob o pretexto da [falsa] sensação de felicidade. Por isso, comecei a olhar para o maço de tabaco como a esposa que acha que ama o marido, mas, na verdade, acumulou tanto rancor que o odeia, e só espera a primeira oportunidade para se ver livre dele para todo o sempre. Assim andámos nos durante alguns anos.

Há cerca de três meses deu-se uma profunda alteração no nosso amor. Naturalmente, e sem perceber porquê deixei de ter vontade de fumar. A pausa para o cigarro pura e simplesmente deixou de acontecer. Os maços desapareceram da mala e comecei a apreciar a liberdade de só fumar em situações estritamente necessárias, nomeadamente quando saio à noite, e sempre em número muito reduzido.

Em simultâneo, comecei a notar diferenças no cabelo, na pele e nas unhas, que estão mais fortes sem aquele tom amarelado, horroroso de fumador. Honestamente, odeio, cada vez mais, o tabaco. Mas fumar nunca me deu tanto prazer. “E esta, Hein?”.  

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